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quinta-feira, 19 de agosto de 2010

História de Joãozinho revoltado um

- puta que pariu, caralho! eu não vou pra porra de aula nenhuma hoje! não enche!- eu pensei que sendo tão ignorante ela ia entender. ia ficar chateada mas ia entender. mas porra, ela não entendeu e ficou chateada mesmo.
enfim, lá vou eu para a minha aula. professoras gordas demais. as minas magras demais. os caras retardados demais e o corno incomprável do porteiro. ligo meu mp3 surrado e fudido e vou andando com o sol dois palmos acima da minha cabeça que vai quase rastejando.
quando eu chego eu dou de cara com a nojenta da dona da cantina. ninguém sabe mas eu acho que ela sempre cospe no lanche de todos e bota pedaços de unha no liquidificador e prepara os sucos "cremosos". antes de chegar à escada de setenta longos degraus, ainda tenho que passar pela sala do filha da puta do coordenador que usa umas perucas, no mínimo, surreais. após vencer toda a escadaria, ainda tenho que me deparar com os retardados que ficam olhando torto pra mim, as piranhas que exalam um cheiro de motel de beira de estrada e uns caras estranhos que ficam sentados no chão, usam calças de pescador, tênis precisamente amarrado, cabelo devidamente penteado e uma puta de uma conversa de nerd.
eu sei que sou um pouco anti-social. eu sei que tenho vários problemas com a minha própria vida mal resolvida, que não lavo os pratos em casa, desobedeço minha mãe as vezes, não forro minha cama e finjo tomar banho, mas porra, porque minha própria mãe, sangua do meu sangue, tem que me enviar todos os dias para esse castigo eterno, para essa tortura psicológica, para esse desgaste físico. o que eu fiz para você, mãe? caralho.
começa a primeira aula. química. o professor é gordo, velho e rabujento. eu acho que ele não é desse planeta, ele fala um monte de coisas que eu não entendo e sei que nunca vou entender e nem quero. quando eu era mais novo, lembro de minha mãe dizer: Joãozinho, para de fazer cara feia porque se o vento passar, você vai ficar assim para sempre. eu acho que foi isso que aconteceu com ele. coitado, eu tenho pena dele as vezes.
segunda-feira. meu final de semana foi um saco. primeira aula de química e agora duas horas de matemática. puta que pariu. quem inventou matemática? quem tentou responder todos os exercícios da matemática? quem inventou os exercícios?
tocou o sinal. caralho, finalmente tocou o sinal! então eu pego meu sanduiche de presunto e queijo que minha mãe enrola no papel laminado e jogo fora, porque ninguém merece, né? eu desço rápido, voando pelo corrimão e chego até lá embaixo, e o Pedro já está me esperando com aquela cara de bunda dele.
- Você já acabou de ouvir o cd da Nação Zumbi que eu te emprestei, viado?
- Qual é, Pedrinho? Deixa de ser chato.
Entre ofensas e brincadeiras, a gente foi lá do outro lado do colégio pra falar com o retardado do Romário, que já reprovou duas vezes na 5ª série. a gente costuma falar que ele vai fazer mestrado na série. eu não aguento mais essa escola passando ano a ano, imagine fazer cada série três vezes. não quero nem pensar nisso.
- Meu irmão, você já viu a gatinha que entrou na 7ª série? - falou o Romário com uma cara enorme de espanto. ele já costumava ser estranho, a cabeça grande, o tronco achatado e os pés torto.
- Como que eu não a vi lá no meu bloco?
- Você do jeito que vive voando, Pedro, não sei como você ainda não caiu na escada.
depois de rirmos um da cara do outro e de falar mais uma vez que o Romarinho é feio pra caralho, nos arremessamos de volta para a história da menina novata e fomos atrás dela lá no bloco onde estudo.
subimos correndo os 70 degraus e xingando o viado que decidiu colocar as salas da 7ª série no último andar. 67, 68, 69... "puta que pariuuuuuuuuu". sempre conto todos os degraus, na tentativa de um dia a escadaria diminuir, e quando estava no último, pisei o pé direito no cadarço do tênis esquerdo e sai cambaleando até o outro lado, só não fui mais longe porque me enrosquei nas pernas de alguém.
- Eita queda do caralho! - falei rindo de mim e curtindo um pouco da dor que estava sentindo quando coloquei o braço para amenizar a queda.
ouvi uma risada que parecia mais uma canção suave. quando olhei para cima das pernas que amorteceram minha queda:
- Caralho, que porra é essa?
- Você devia me agradecer e não me xingar, não é? - disseram as pernas falantes rindo.
e aí já não eram apenas pernas, eram muito mais. não que as pernas não bastassem, e como bastavam, mas, porra, o resto valia muito mais a pena.
- Você é linda mesmo.
- O quê? Acho que você bateu a cabeça também.
- Quer dizer, obrigado pelas suas pernas.
- Han? - e a risada dela intensificou-se.
- Não, você está me entendendo mal. - falei levantando-me subitamente - Eu só quis agradecer por você ter amenizado minha queda.
- Não foi nada. - e continuou rindo.
finalmente me dei conta de que todos estavam olhando para mim, falando o quanto eu era burro pra caralho e rindo muito da minha queda. rindo muito mesmo. até fizeram uma comunidade no orkut para mim.
agora as pernas que me ajudaram, deram meia volta e saíram sem dizer mais nada.

Continua...

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